segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Para quem pode me ouvir sussurrar. 41

Ela permaneceu em silêncio. Eu sentia, pesadamente, que seus olhos me observavam, enquanto seu coração parecia bater com uma velocidade e uma intensidade que eu nunca havia pensado que poderia bater. E eu podia sentir que o meu também batia na mesma velocidade. Nunca, em voz alta, eu chamara alguém de "meu amor" antes...

Foi então que consegui erguer meu corpo, e olhá-la nos olhos. Ela estava vermelha, e parecia ter segurado o choro por muito tempo, até que eu pude ver uma lágrima rolar. Mas ela não soluçava: estava serena, e agora apertava minhas mãos nas dela com a força que uma criança usaria para segurar algo que gosta muito... E eu sorri. Eu sorri, olhando para seu rosto vermelho e seus olhos úmidos e brilhantes, sem me dar trabalho em enxugar as minhas lágrimas ou impedi-las. Nossos olhos se encontravam de forma tão carinhosa que eu não queria, nunca parar de olhar... Até que percebi que ia chegando cada vez mais perto, debruçando-me sobre seu corpo, e quando dei por mim estava a menos de um palmo de seu rosto. Foi quando ela tocou minha nuca e, puxando-a com delicadeza, me beijou...

Era como se aquele fosse o primeiro beijo de minha vida... Como se fosse um beijo que sonhamos em ter a vida toda... Todos os pelos de meu corpo se arrepiaram, e eu esqueci completamente de respirar... Meus olhos fechados... E eu, sentindo Cláudia comigo.

Alguma de vocês se lembra do primeiro beijo? O meu havia sido constrangedor, então eu tentava apagá-lo da memória. Talvez aquele beijo... Aquele, naquele instante, com Cláudia, devesse ter sido o meu primeiro beijo. Era algo como não sentir as pontas de meus dedos, e sentir os meus pés formigando... Os lábios dela estavam quentes, como sempre estiveram, mesmo depois de tudo aquilo... Eu podia sentir uma de minhas lágrimas gotejando no rosto dela, sem que eu pudesse evitar, mas antes que eu fizesse qualquer coisa sobre isso ela tocou meu rosto e, com o polegar, enxugou minhas lágrimas... Tudo aquilo enquanto nos beijávamos demoradamente, sem pensar em tempo ou espaço: perto dela, ambos ficavam difusos, complexos, indiferentes em minha mente. Era quase como se não existissem...

Para quem pode me ouvir sussurrar. 40

Os pais dela estavam assustadíssimos, mas assim que falaram com um médico (depois de bem uma hora), ficaram mais tranquilos e se sentaram. O médico veio em nossa direção em seguida, dizendo que Cláudia precisava descansar e que poderíamos vê-la em breve, e que o único dano mais grave era uma batida muito forte na cabeça que poderia causar problemas posteriores, então ele me pediu para prestar atenção. Já devia saber que ela morava comigo, especialmente porque, quando olhei para onde deviam estar os pais dela, já não havia mais ninguém. Fiquei surpresa, até que os vi saindo de um dos quartos, e pareciam mais tranquilos. Foram embora.

Enquanto o homem que a atropelara desculpava-se em meus ouvidos toda hora, eu estava mais nervosa. Assim que me levantei, senti um golpe de tranquilidade acertar meu estômago, e outro, de ansiedade, me puxar para dentro do quarto de Cláudia. Quando entrei, ela tinha um curativo pouco chamativo na testa, mas que não prejudicava sua beleza...

Sentei-me ao seu lado, sem conseguir falar. Tudo o que eu podia fazer era olhar em seus olhos, cansados, porém abertos. Ela abriu a mão perto de onde eu estava sentada, em sinal para que eu a segurasse, e eu o fiz, com certa fraqueza ainda dominando meu corpo. Tudo tinha acontecido tão rápido, que eu não conseguia pensar direito. Então toda a minha existência e tudo o que eu sentia naquele momento desabou quando eu ouvi ela sussurrar:

— Que bom que você veio... Estava pensando em você...

Sua voz era baixa, fraca... Mas ainda assim foi forte o suficiente para arrancar de mim uma lágrima e um soluço, enquanto eu me debruçava com cuidado e a abraçava, repousando minha cabeça contra seu peito. Podia ouvir seu coração... Estava batendo um pouco acelerado, e ela respirava mais rápido, mas logo percebi que não era por causa do acidente: ela me apertava contra si num abraço quente e reconfortante. E eu só conseguia soluçar de preocupação, de susto, de nervoso... De amor.

Respirávamos pesadamente... Eu podia sentir as mãos dela em minhas costas, e ela certamente sentia minhas lágrimas molhando sua blusinha branca. Meus olhos estavam fechados com força, e eu chorava sem conseguir parar, como se só agora eu tivesse percebido o que estava acontecendo, enquanto ela me apertava mais forte a cada soluço que eu dava. Quando eu finalmente consegui encontrar forças, sussurrei de volta com a voz ainda embargada:

— Eu fiquei tão preocupada, minha pequena... Fiquei com tanto medo.. — Então, apertei-a um pouco mais com as mãos, cerrando meus punhos em sua blusa, como se tivesse medo de lembrar — Meu amor...